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quarta-feira, 3 de agosto de 2011

Disseram-me

As gramáticas normativas, comumente, pregam que em Língua Portuguesa nenhum pronome oblíquo átono pode iniciar frases, ou nas palavras de um dos maiores gramáticos desse país, Domingos Paschoal Cegalla: "...não se abre frase com o pronome oblíquo". Mas nós sabemos que essa regrinha, chamada de ênclise, não é uso comum no português não-padrão e muito menos no português culto. Engana-se aquele que pensa nunca haver usado um único pronome oblíquo átono para iniciar uma frase. Todavia não venho dizer o que está certo ou errado em Português, apenas deixar aqui uma crônica de Luís Fernando Veríssimo. Deixemos para depois uma análise da colocação pronominal na língua viva e venhamos à crônica.

 "Papos

- Me disseram...

- Disseram-me.

- Hein?

- O correto é "disseram-me". Não "me disseram".

- Eu falo como quero. E te digo mais... Ou é "digo-te"?

- O quê?

- Digo-te que você...

- O "te" e o "você" não combinam.

- Lhe digo?

- Também não. O que você ia me dizer?

- Que você está sendo grosseiro, pedante e chato. E que eu vou te partir a cara. Lhe partir a cara. Partir a sua cara. Como é que se diz?

- Partir-te a cara.

- Pois é. Parti-la hei de, se você não parar de me corrigir. Ou corrigir-me.

- É para o seu bem.

- Dispenso as suas correções. Vê se esquece-me. Falo como bem entender. Mais uma correção e eu...

- O quê?

- O mato.

- Que mato?

- Mato-o. Mato-lhe. Mato você. Matar-lhe-ei-te. Ouviu bem?

- Eu só estava querendo...

- Pois esqueça-o e para-te. Pronome no lugar certo é elitismo!

- Se você prefere falar errado...

- Falo como todo mundo fala. O importante é me entenderem. Ou entenderem-me?

- No caso... não sei.

- Ah, não sabe? Não o sabes? Sabes-lo não?

- Esquece.

- Não. Como "esquece"? Você prefere falar errado? E o certo é "esquece" ou "esqueça"? Ilumine-me. Me diga. Ensines-lo-me, vamos.

- Depende.

- Depende. Perfeito. Não o sabes. Ensinar-me-lo-ias se o soubesses, mas não sabes-o.

- Está bem, está bem. Desculpe. Fale como quiser.

- Agradeço-lhe a permissão para falar errado que mas dás. Mas não posso mais dizer-lo-te o que dizer-te-ia.

- Por quê?

- Porque, com todo este papo, esqueci-lo."

(Crônica extraída do livro "Comédias para se Ler na Escola".)

Cristo, o Educador

Há algum tempo recebi por e-mail um texto que reflete bastante a situação da educação no Brasil hoje. Abaixo está o texto de que falo, na íntegra, seguido do link para o blog de onde o retirei.


Naquele tempo, Jesus subiu a um monte seguido pela multidão e, sentado sobre uma grande pedra, deixou que os seus discípulos e seguidores se aproximassem. 
Ele os preparava para serem os educadores capazes de transmitir a lição da Boa Nova a todos os homens. Tomando a palavra, disse-lhes:
 - “Em verdade, em verdade vos digo:
 Felizes os pobres de espírito, porque  deles é o reino dos céus.
 Felizes os que têm fome e sede de justiça, porque  serão saciados.
 Felizes os misericordiosos, porque eles...”
 Pedro o interrompeu:
 - Mestre, vamos ter que saber isso de cor?
 André perguntou:
- É pra copiar?
 Filipe lamentou-se:
- Esqueci meu papiro!
 Bartolomeu quis saber:
 - Vai cair na prova?
 João levantou a mão:
 - Posso ir ao banheiro?
 Judas Iscariotes resmungou:
 - O que é que a gente vai ganhar com isso?
 Judas Tadeu defendeu-se:
- Foi o outro Judas que perguntou!
 Tomé questionou:
- Tem uma fórmula pra provar que isso tá certo?
 Tiago Maior indagou:
 - Vai valer nota?

 Tiago Menor reclamou:
- Não ouvi nada, com esse grandão na minha frente.
 Simão Zelote gritou, nervoso:
 - Mas porque é que não dá logo a resposta e pronto!?
  Mateus queixou-se:
 - Eu não entendi nada, ninguém entendeu nada!

 Um dos fariseus, que nunca tinha estado diante de uma multidão nem ensinado  nada a ninguém, tomou a palavra e dirigiu-se a Jesus, dizendo:
 - Isso que o senhor está fazendo é uma aula? Onde está o seu plano de curso e a avaliação diagnóstica? Quais são os objetivos gerais e específicos? Quais são as suas estratégias para recuperação dos conhecimentos prévios?

 Caifás emendou:
- Fez uma programação que inclua os temas transversais e atividades integradoras com outras disciplinas? E os espaços para incluir os parâmetros curriculares gerais? Elaborou os conteúdos conceituais, processuais e atitudinais?
Pilatos, sentado lá no fundão, disse a Jesus:

 - Quero ver as avaliações da primeira, segunda e terceira etapas e reservo-me o direito de, ao final, aumentar as notas dos seus discípulos para que se cumpram as promessas do Imperador de um ensino de qualidade. Nem pensar em números e estatísticas que coloquem em dúvida a eficácia do nosso projeto. E vê lá se não vai reprovar alguém! Lembre-se que você ainda não é professor titular...
 
Moral da história: "Nem Cristo aguentaria ser professor nos dias de hoje" } 
 
Fonte: SuperDaHora

sábado, 16 de julho de 2011

Erro de Português?

Certa vez fui mostrar à diretora de uma escola em que trabalhei um poema produzido por uma aluna da quinta série do ensino fundamental; ao ver o texto, fez uma careta, daquelas quando pisamos em um espinho, e disse "é... mas tem que melhorar o português". Pense! O que vale mais? A produção ou uns meros erros que não são de português? Pois é isso mesmo! O problema é que muito se confunde ortografia com língua, ou melhor dizendo, professores de matemática, história, geografia, os próprios professores de língua portuguesa, pedagogos, médicos, advogados, jornalistas, pais, tios, avós e um imensa lista fazem essa confusão.
A ortografia de uma língua é maneira pela qual se tenta representar convencionalmente os seus sons num papel. A língua, no nosso caso a portuguesa, possui regras de funcionamento (aqui não me refiro à gramática normativa), essas regras se organizam de acordo com as disposições do sistema linguístico e de acordo com os próprios falantes/escreventes, pois estes tem o poder de criar, recriar, modificar e combinar os elementos da língua.
Uma criança quando não escreve algumas palavras conforme a ortografia vigente, não significa que ela não sabe português, e muito menos que não consegue se expressar direito. Eis aí um grande equívoco de quem assim pensa: imagine uma criança de 5 anos de idade, certamente ela ainda não domina a modalidade escrita da língua, no entanto, expressa-se pela fala perfeitamente. Comunica-se em sua língua materna, o que só pode comprovar que ela sabe português tanto quanto qualquer um de nós letrados.
Muitas crianças têm suas produções jogadas no lixo simplesmente porque o professor de língua portuguesa (ou qualquer outro adulto), aquele que deveria incentivar, repreende e escanteia por conta de um preconceito. Mas aí você deve se questionar "e se não o corrigirmos, ele não aprenderá a ortografia aceita". Não falo de não corrigir, mas de não lhe passar uma correção justamente no momento em que ele está mostrando sua produção. A correção é algo que pode ser trabalhado. O professor pode observar as digressões e elaborar atividades em cima delas, a serem trabalhadas noutro momento. Ou, se for corrigir no ato, buscar um jeito que a criança não seja reprimida: elogiar o texto dela, dar valor ao conteúdo ajuda bastante na correção ortográfica. E ela, logicamente, vai se sentir satisfeita por perceber que você se interessa por aquilo que ela tem para te mostrar. Seja lá como se pretenda trabalhar a ortografia, o importante mesmo é incentivar a escrever, pois quanto mais essa criança escrever mais se apodera da ortografia "correta". Ler, escrever; ler, escrever; escrever, ler; escrever, ler; e depois ler, escrever novamente consistem na prática eficaz para a absorção da modalidade escrita da língua, e por sua vez, de sua ortografia oficial.
Eu, honestamente, não sei a ortografia de todas as palavras, e seria um hipócrita se dissesse que todas as vezes que escrevo não tenho uma única dúvida quanto à maneira de grafar alguma palavra. Nesses momentos vou pro dicionário!

sábado, 2 de julho de 2011

Gerundismo é feio

Quem nunca ouviu falar de gerundismo? Ou quem nunca ouviu o outro criticar o telemarketing porque está cheio dos gerundismos? Mas antes de adentrar a “questão gerundista”, deixem-me explicar a causa da escritura dessas linhas.
 
Recentemente ouvi um podcast bastante conhecido no mundo dos blogs (pelo menos penso que seja) quando em um dado momento da gravação o podcaster diz “Nós estaremos avisando...”. Logo em seguida o seu colega o repreende por usar o “gerundismo”. A justificativa para não usar tal estrutura: são dois verbos quando somente um basta. Segundos depois alguém mais ao fundo reclama que “é feio”.
 
Duas coisas: não está errado e tampouco é feio. Não tenho por pretensão tratar do certo e do errado na gramática normativa, mas abordar uma estrutura viva e muito bem usada na língua portuguesa, o gerúndio. Também não tenho interesse em explicar o que é o gerúndio, mas constatar sua existência na língua. E Já que a dúvida dos prescritivistas é se isto ou aquilo está certo ou errado na gramática, restrinjo-me a dizer que, pensando na tradição gramatical, está completamente correto o uso do gerúndio. Basta abrir qualquer gramática, sendo dos conceituados Celso e Cunha, do reconhecido Bechara, ou não, ver-se-á que o gerúndio está lá, entre as formas nominais do verbo.
 
E quanto ao feio? Feio que nada! Mas grandes escritores não ficam por aí de gerundismo, seus mais lindos poemas e romances não têm dessas coisas. “Por ti – as noites eu velei chorando, Por ti – nos sonhos morrerei sorrindo!” Escreveu Álvares de Azevedo em Soneto. Carlos Drummond de Andrade ao ver a amada “caída na areia do circo e o leão que vinha vindo”, deu “um pulo desesperado” e o leão comeu os dois na Balada de Amor Através das Idades. O Dom Casmurro de Machado de Assis deixou claro que a porta que ligava sua casa a de Capitu “abria-se empurrando de um lado ou puxando de outro”. Provavelmente estes escritores não sabiam quão é feio usar o gerúndio. Não sabiam o português bonito, o português correto! Machado de Assis, fundador da Academia Brasileira de Letras e um dos maiores cânones da literatura brasileira, certamente, deveria ter tido vergonha de escrever tais absurdos. Talvez Drummond merecesse ser preso pelos crimes cometidos contra a língua. Azevedo, no mínimo, não soube chorar nem sorrir.
 
O gerundismo foi/é o neologismo usado para se referir às pessoas que usa(va)m o gerúndio em excesso, principalmente o pessoal do telemarketing com o “vou estar transferindo”. Contudo, o preconceito que girou em torno do termo “gerundismo” acabou por criar a ideia de que o gerúndio é algo errado e inaceitável, ou melhor, criou a ilusão de que gerundismo e gerúndio são simplesmente a mesma coisa. Como já dito, o gerúndio é a forma nominal do verbo que representa uma ação contínua. E o gerundismo é uso desmedido da construção verbo ir conjugado + verbo estar no infinitivo + gerúndio: “Vou estar transferindo sua ligação para o próximo setor, para que o sr. possa estar confirmando os seus dados; e ao término da ligação, o sr. vai estar recebendo o protocolo de nosso atendimento.” Certamente a construção ir+estar+gerúndio tende a soar artificial e a um falso cumprimento do prometido, assim como a repetição excessiva demonstra ausência de domínio ou desconhecimento de outras estruturas. Um outro problema é quando temos uma ação pontual como enviar um e-mail e você simplesmente diz “Vou estar enviando um e-mail ao meu superior.” Esse ato enunciativo seria sintaticamente aceitável, do ponto de vista apenas estrutural (sem entrar na questão se o estrutural é suficiente), mas semanticamente confuso.  Contudo enunciações como “Passei a manhã de domingo cozinhando.”, “Estava estudando para a prova de história.” e “Estaremos avisando nossos ouvintes.” são completamente possíveis tanto do ponto de vista sintático quanto semântico. Elas indicam ações de continuidade e não pontualidade. Por isso não confundir gerúndio com ir+estar+gerúndio, e não sair por aí corrigindo as pessoas pelo simples senso comum ou pelo “achismo”, mero preconceito.

sábado, 25 de junho de 2011

Você sabe com quem está falando?

Vi este vídeo e simplesmente o achei brilhante: